terça-feira, 26 de outubro de 2021

O TEXTO DO TAO TE CHING (Lao tse)

 Tao (Caminho)


I
1. O Tao (Caminho) que pode ser caminhado
não é o 
Caminho Imutável (Ch’ang-Tao)
O nome (ming) que pode ser pronunciado
não é o Nome Imutável (
Ch’ang Ming).

2. Do que não tem nome (wu-ming) surgiu “Céu e Terra”;
e dos nomes (ming) surgiram as dez mil coisas.

3. Quando não existe (wu) pressentimos sua essência (miao);
e quando existe (yu) vemos sua aparência (chiao).

4. Ambos têm a mesma origem,
mas diferem no nome.
O mais obscuro mistério (hsüan): eis o portal (chiao) de onde surgiu sua essência (miao).

II
1. Quando todos os homens sob o Céu julgam o belo como belo,
é aí que surge o feio.
Quando todos os homens sob o Céu julgam o bem como bem,
é aí que surge o mal.

2. A não-existência e a existência geram-se mutuamente; 
o fácil e o difícil completam-se mutuamente;
o curto e o longo contrastam mutuamente;
o baixo e o alto determinam-se mutuamente;
o silencio e o som harmonizam-se mutuamente;
o antes e o depois seguem-se mutuamente.

3. Assim, o Mestre:
age (wei) sem ações (wu-wei);
fala (ming) sem palavras (wu-ming);
as dez mil coisas se desenvolvem espontaneamente (tzu-jan)
e ele as aceita como são;
produz sem se apropriar delas;
dá sem esperar retribuição;
realiza a obra sem exigir os créditos.
E porque não exige os créditos a obra permanece com ele.

III
1. Não exaltar (shang) os homens superiores (hsien)
evita que eles compitam;
não acumular objetos de valor;
evita que os homens roubem;
não excitar os desejos;
evita que a mente e o coração dos homens se agite.

2. Assim, o Mestre governa:
esvaziando a mente e o coração (hsu-hsin);
enchendo o ventre;
enfraquecendo os desejos;
fortalecendo os ossos.

3. Ele mantém os homens sem conhecimentos e sem desejos (wu-yu) 
e evita que os homens com conhecimentos ajam.

4. Sem ações (wu-wei), tudo permanece em ordem.

IV
1. O Tao parece vazio (hsu) como o interior de um vaso;
mas seu uso (yung) nunca se esgota.
Insondável, talvez o antepassado das dez mil coisas.

2. Apara as arestas;
desembaraça a meada;
obscurece a luminosidade;
assenta a poeira .

3. Profundo e sereno, parece Imutável (Ch'an).
Não sei de quem possa ser filho.
Parece anterior ao Imperador Ancestral.

V
1. "Céu e Terra” não é humanitário (jen),
para ele as dez mil coisas são como cães de palha.

2. O Mestre não é humanitário (jen),
para ele os homens são como cães de palha.

3. “Céu e Terra” parece vazio (hsu) como o interior de um fole;
mas seu uso nunca se esgota;
ativado produz sempre mais.

4. As palavras são inúteis.
É melhor manter-se no interior (chung).

VI
1. O “espírito (shen) do vale (ku)” nunca morre.
Chama-se a “fêmea misteriosa”.
O portal da “fêmea misteriosa” é a raiz de onde surgiram  "Céu e Terra”.

2. Está aqui dentro de nós o tempo todo; absorve-o que nunca se esgota.

VII
1. “Céu e Terra” é Imutável (Ch’ang).

2. É Imutável (Ch'ang) porque não vive para si mesmo,
por isso é Imutável (Ch’ang)

3. Assim, o Mestre, colocando-se atrás
está sempre na frente.
Porque não vive para si mesmo, é Imutável (Ch'ang).

4. Não será que justamente por não ter objetivos,
seus objetivos se realizam?

VIII
1. O mais valioso dos bens sob o Céu é como a água.
A água beneficia as dez mil coisas e sem competir com
elas permanece nos lugares que os outros desdenham.
Por isso se assemelha ao Tao.


2. Se os homens consideram o chão o melhor lugar para construir suas casas;
se entre os pensamentos valorizam os mais profundos;
se na amizade valorizam a gentileza;
se nas palavras valorizam a verdade;
se no governo valorizam a ordem;
se nas ações valorizam a eficiência;
se nos atos valorizam a oportunidade;
é porque preferem não competir.

3. E porque não competem não erram.

IX
1. Enche o vaso até a borda
e te arrependerás.
Afia uma lâmina até o limite máximo
e logo perderá seu gume.
Um quarto cheio de ouro e jade
não pode ser protegido.
Riquezas, honrarias e orgulho
levam à desgraça.

2. Realizada a obra é hora de desaparecer.
Esse é o Tao do Céu (Ti’en).

X
1. Podes manter o espírito (ying-po) abraçado ao Uno
sem nunca se separar?

2. Podes concentrar o sopro de vida (ch’i) até torná-lo
tão suave como o de um bebê?

3. Podes purificar tua visão misteriosa (hsüan-lan) até torná-la imaculada?

4. Podes amar os homens e governar o império
sem conhecimentos (chih)?

5. Podes  abrir e fechar as portas do Céu como se fosses a fêmea de um pássaro?

6. Podes penetrar em tudo sem nunca ousar agir?

7. Alimenta e nutre;
produz sem se apropriar;
dá sem exigir retribuição;
guia sem comandar.
Esse é o 
Poder Misterioso (Hsüan-Te) .

XI
1. Trinta raios convergem para o centro da roda,
mas é do vazio (wu) que depende sua utilidade.
Modela-se a argila em forma de vaso,
mas é do 
vazio que depende sua utilidade.
Constroem-se portas e janelas para fazer um 
quarto, mas é do vazio que depende sua utilidade.

2. Assim, da matéria (yu) depende a substância, 
e do vazio (wu) a sua utilidade.

XII
1. As cinco cores cegam os olhos do homem.
Os cinco sons ensurdecem os ouvidos do homem.
Os cinco sabores estragam o paladar do homem.

2. Corridas e caçadas agitam a mente e o coração (hsu) do homem.
Objetos de valor prejudicam a conduta do homem.

3. Assim, o Mestre se ocupa com o ventre
e não com os olhos.
Ele aceita isto e rejeita aquilo.

XIII
1. “Deves temer tanto a sorte quanto o azar”.
“Considera um grave problema com a mesma seriedade com que você considera seu corpo”.

2. O que significa: “deves temer tanto a sorte quanto o azar”?
A sorte é considerada inferior.
Deves temer tanto quando a recebes como quando a perdes. É isso que significa “deves temer tanto a sorte quanto o azar”.

3. O que significa: “considera um grave problema com a mesma seriedade com que você considera seu próprio corpo”?
A única razão pela qual eu tenho um grave problema é porque tenho um corpo.
Se não tivesse um corpo, que problema eu poderia ter?

4. Assim podemos aceitar o ditado: “àquele que valoriza o
Império como seu próprio corpo pode-se confiar o Império”;
“àquele que estima o Império, como seu próprio corpo, pode-se confiar o Império.”

XIV
1. Aquilo que olhamos e não conseguimos ver,
pois é o invisível (i).
Aquilo que escutamos e não conseguimos ouvir,
pois é o inaudível (hsi).
Aquilo que tocamos e não conseguimos sentir,
pois é o intangível (wei).
Esses três estados, cuja essência é indecifrável,
fundem-se no Uno

2. Sua face superior não é iluminada
e sua face inferior não é obscura.
Imutável (Ch’ang), não pode ser nomeado,
retorna à não-existência (wu).
É a forma do sem forma, é a imagem do invisível,
é chamado o mistério (hsuan).
Indo ao seu encontro, não vemos seu rosto;
seguindo-o, não vemos suas costas.

3. Aqueles que praticavam o Tao antigo,
dominavam o momento presente 
e assim conheciam a origem do princípio.
Isso é chamado a essência (miao) do Tao.

XV

1. Os antigos Mestres do Tao
devido a sua sutileza profunda e a sua misteriosa harmonia (hsüan-t’ung),
conseguiam passar despercebidos.
Como 
conseguiam passar despercebidos
só a muito custo era possível descrever seu aspecto exterior.

2. Cautelosos como quem atravessa um rio congelado no inverno;
vigilantes como quem teme a todos em volta;
discretos como hóspedes;
desvanecendo-se como o gelo que se derrete;
simples como a madeira bruta (p’u);
vazios como o vale;
obscuros como a lama.

3. Assim, quem mais poderia através da quietude (hsu) tornar a água turva, límpida?
Quem mais poderia, após ficar imóvel, voltar à vida através da atividade?

4. Aqueles que praticavam o Tao antigo não tentavam se
encher até a borda;
e porque não tentavam se encher até a borda não se exauriam,
evitando assim de serem renovados.

XVI
1. Alcança a quietude (hsu) completa.
Mantêm a serenidade perfeita.

2. As dez mil coisas entram na existência (yu)
e depois as vemos retornar (fu).
Contempla as coisas que florescem,
cada qual retorna (fu) à origem.
Retornar (fu) à origem significa quietude (hsu).
Quietude (hsu) significa retornar (fu) ao destino (ming).

3. Retornar ao destino (ming) significa Imutável (Ch’ang).
Praticar o Imutável (Ch'ang) é chamado esclarecimento.
Não praticar o Imutável (Ch'ang) leva à desgraça.

4. Aquele que pratica o Imutável (Ch'ang) abraça as dez mil coisas.
Aquele que abraça as dez mil coisas é imparcial.
Aquele que é imparcial é Mestre.
Aquele que é Mestre abraça o Céu.
Aquele que abraça o Céu está em harmonia com o Tao.

5. Aquele que está em harmonia com o Tao é Imutável (Ch’ang),
e se livra do perigo (pu-tai) pelo resto de sua vida.

XVII
1. Nos tempos antigos os homens desconheciam que existiam soberanos.
Na época seguinte os soberanos foram amados e louvados.
Mais tarde, foram temidos.
Por último, foram desprezados.

2. Assim, foi somente quando os soberanos deixaram de acreditar
nos homens que os homens não acreditaram mais neles.

3. Como eram discretos aqueles soberanos antigos, mostrando
com seu silêncio o pouco valor das palavras!

4. Realizada a obra, os homens comentavam: “eles seguiram a Natureza” (tzu-jan).

XVIII
1. Quando os homens se afastam do Tao aparece a humanitário (jen) e a moralidade (i).

2. Quando surgem os conhecimentos (hsieh) e a sabedoria aparecem os grandes hipócritas.

3. Quando as seis relações deixam de ser harmoniosas aparecem a piedade filial (hsiao-tz’u) e o amor paterno.

4. Quando há confusão e desordem entre os estados aparecem os ministros leais.

XIX
1. Livra-te dos conhecimentos, abandona a sabedoria
e os homens sairão beneficiados cem vezes.
Livra-te do humanitarismo (jen), abandona a moralidade (i)
e os homens retornarão à piedade filial (hsiao-tz’u) e ao amor paterno.
Livra-te do utilitarismo (li), abandona a habilidade
e não haverá mais bandidos nem ladrões.

2. Se após essas atitudes a vida se tornou insípida, procura:
a pureza da seda crua (su);
a simplicidade da madeira bruta (p’u);
o esquecimento de si mesmo;
ter poucos desejos (kua-yu).

XX
1. Livra-te dos conhecimentos e não haverá mais problemas.

2. Qual é a diferença entre “sim senhor” e “claro que não”?
Qual é a diferença entre o bem e o mal?

3. O ditado: “o que os homens temem eu também devo temer”,
é muito confuso e a confusão não tem fim!

4. Os homens vivem como se a vida fosse uma grande festa de sacrifício,
ou como se subissem a uma torre em primavera;
só eu permaneço inerte, sem desejos, como um bebê que ainda não aprendeu a sorrir;
desamparado, como se não tivesse um lar.
Os homens vivem na abundância; só eu pareço ter perdido tudo;
a minha mente é como a de um ignorante, embotada e confusa.
Os homens parecem brilhantes; só eu pareço obscuro.
Os homens discriminam e parecem seguros de si mesmos; só eu não discrimino;
indistinto como o mar; soprando à deriva, como o vento sem direção.
Os homens parecem ter vontades, só eu pareço teimoso e rústico.

5. Só eu sou diferente pois aprecio o alimento da Mãe (Tao).

XXI
1. Os sinais do Te (Poder) provém do Tao.

2. O Tao é invisível e intangível.
Invisível e intangível, mas dentro dele estão contidas as formas.
Invisível e intangível, mas dentro dele estão contidas as coisas.
Profundo e obscuro, mas dentro dele está contida a essência (ching).

3. A essência (ching) é real e dela temos evidências, pois desde os
tempos mais remotos suas manifestações nunca cessaram e é
através delas que podemos pressentir a origem das dez mil coisas.
Como posso pressentir a origem das dez mil coisas?
Justamente através disto!

XXII
1. “Sê flexível e te conservarás inteiro”.
Enverga-te e ficarás ereto.
Esvazia-te e serás repleto.
Exaure-te e serás renovado.
Aquele que tem pouco pode receber mais.
Aquele que tem muito fica confuso.

2. Assim, o Mestre abraça o Uno 
e se torna o modelo de tudo o que existe sob o Céu.
Ele não aparece, mas é esclarecido;
não se explica, mas é proeminente;
não se enaltece, mas é reconhecido;
não se gaba, mas dura por muito tempo.
E porque não compete ninguém pode competir com ele.

3. Será o antigo ditado: “Sê flexível e te conservarás inteiro”,
uma sentença vazia?
Em verdade, é sendo flexível que te conservarás inteiro.

XXIII
1. A Natureza (tzu-jan) fala pouco.
Um vendaval não dura a manhã inteira.
Um aguaceiro não dura o dia todo.
E quem os produz? A Natureza.
Se as ações da Natureza não conseguem durar muito tempo,
quanto menos as ações do homem!

2. Aquele que pratica o Tao (Caminho)
se identifica com o Tao;
aquele que possui o Te (Poder)
se identifica com o Te;
aquele que abandona o Tao,
se identifica com o abandono do Tao.
Aquele que se identifica com o Tao,
Tao fica feliz de estar com ele;
aquele que se identifica com o Te
o Te fica feliz de estar com ele;
e aquele que se identifica com o abandono do Tao,
o abandono do Tao também fica feliz em abandoná-lo.

4. Assim, foi somente quando os soberanos deixaram de acreditar
nos homens que os homens não acreditaram mais neles.

XXIV
1. Aquele que fica na ponta dos pés não tem firmeza;
aquele que dá grandes passadas não vai muito longe;
aquele que aparece não é esclarecido;
aquele que se explica não é proeminente;
aquele que se enaltece não é reconhecido;
e aquele que se gaba não dura por muito tempo.

2. Essas ações são como “restos de comida” ou “um tumor purulento”,
que todas as criaturas detestam.
Assim, aquele que pratica o Tao se afasta delas.

XXV
1. Há uma coisa indiferenciada, porem completa, anterior a “Céu e Terra”.
Silenciosa e sem forma, não depende de nada e é Imutável (Ch’ang), 
opera em toda parte e está livre do perigo.
Pode ser considerada a mãe  das dez mil coisas.

2. Como desconheço seu nome chamo-a de Tao.
Se fosse obrigado a descrevê-la diria que é grande.
Grande significa que opera em toda parte.
Operar em toda parte significa que vai para longe.
Ir para longe significa que retorna ao lugar de origem.

3. Assim, o Tao é grande;
o Céu é grande;
a Terra é grande;
o Mestre é grande.
Há quatro grandes no Universo e o mestre é um deles.

4. O Mestre segue o modelo da Terra;
a Terra segue o modelo do Céu;
o Céu segue o modelo do Tao;
o Tao segue o modelo da Natureza (tzu-jan).

XXVI
1. O pesado é a raiz do leve.
A quietude (hsu) é a raiz da agitação.
Assim, o Mestre viaja o dia inteiro sem se afastar de
sua bagagem e mesmo diante de magníficas paisagens 
ele permanece quieto e indiferente.

2. Como poderia um soberano, dono de inúmeros carros de guerra, se comportar levianamente com aqueles que ele governa?

3. Se for leviano perde a raiz.
Se for apressado perde o trono.

XXVII
1. O caminhante perfeito não deixa pegadas;
o discurso perfeito não tem palavras;
o contador perfeito não usa ábaco;
a porta perfeitamente trancada não tem tranca e mesmo assim
ninguém consegue abri-la;
o nó perfeitamente amarrado não tem corda e mesmo assim
ninguém consegue desatá-lo.

2. Assim, o Mestre, ajuda os homens da forma mais perfeita,
ele não rejeita ninguém;
e ajuda as coisas da forma mais perfeita, ele não rejeita nenhuma.
Isso se chama: “praticar (hsi) a luz”.

3. Assim, o homem perfeito é o mestre do imperfeito;
e o homem imperfeito uma lição para o perfeito.
Aquele que não valoriza seu Mestre e aquele que não aprecia
a lição, mesmo sendo eruditos, ficam confusos.
Essa é a essência (miao) do mistério (hsuan).

XXVIII
1. Aquele que conhece a atitude do macho mas segue o modelo da fêmea
 é como o vale do Império.
Sendo como o vale do império alcança o Ch’ang-Te (Poder Imutável)
e retorna (fu) à infância.

2. Aquele que conhece o branco mas segue o modelo do preto
 é como o vale do Império.
Sendo como o vale do império não se desvia do Ch’ang-Te (Poder Imutável)
e retorna (fu) à não-existência (wu).

3. Aquele que conhece a glória, mas segue o modelo do anonimato,
é como o vale do Império.
Sendo como o vale do Império não se afasta do Ch’ang-Te (Poder Imutável)
 e retorna (fu) à simplicidade da madeira bruta (p’u).

4. Quando os homens usam a madeira bruta (p’u) a transformam nos
diversos utensílios.
Quando o Mestre a usa se transforma no Chefe dos Ministros.
Assim, o talhador perfeito não precisa talhar nada.

XXIX
1. Aquele que quiser agir sobre o Império não o conseguirá.
O Império é como um vaso encantado sobre o qual não se pode agir (wei).
Aquele que quiser agir (wei) sobre ele o danifica;
aquele que quiser segurá-lo, perde-o.

2. Entre as criaturas, algumas lideram e outras seguem;
alguns sopram quente e outros sopram frio;
alguns são fortes e outros são fracos;
alguns ascendem e outros declinam.
Assim, o Mestre evita os excessos, as extravagâncias e os extremos.

XXX
1. Aquele que pratica o Tao
não aconselha o soberano a conquistar o império pelo uso das armas,
pois tais ações recaem sobre a sua própria cabeça.
Onde acampa um exército crescem cardos e espinhos.
Grandes guerras são seguidas por anos de fome.

2. Assim, um bom comandante cumpre a missão e se detém,
pois não ousa tirar vantagem da sua vitória.
Cumpre a missão e não se gaba disso;
cumpre a missão e não se ufana disso;
cumpre a missão e não se orgulha disso;
cumpre a missão só quando não há outra opção;
cumpre a missão sem violência.

3. Quando as coisas alcançam o apogeu encontram o declínio e isso é contrário ao Tao.
Tudo o que é contrário ao Tao morre cedo.

XXXI
1. Armas sofisticadas são instrumentos de mau agouro, odiadas pelo homem.
Assim, aquele que pratica o Tao as evita.

2. Quando o bom soberano está em casa o lugar de honra é à
esquerda e à direita quando está em guerra.
Armas são instrumentos de mau agouro, não instrumentos de um
bom soberano.
Ele só as utiliza quando não há nenhuma outra opção, pois considera a quietude como a principal virtude.
No cumprimento da missão não encontra prazer, pois aquele
que se deleita com a matança dos homens nunca conseguirá ordenar o Império.

3. Em ocasiões auspiciosas a esquerda é o lugar de honra e em ocasiões não auspiciosas a direita é o lugar de honra. O Tenente Coronel ocupa o lugar à esquerda, e o General ocupa o lugar à direita.

4. Isso quer dizer que o ritual segue aquele das cerimônias funerais. Pelo massacre das multidões vamos chorar com pena e dor. Pela vitória, vamos, nesta ocasião, observar as cerimônias funerais.

XXXII
1. O  Ch’ang Tao (Caminho Imutável) não tem nome (wu-ming).
Embora a simplicidade da madeira bruta (p’u) possa parecer
insignificante, ninguém no mundo pode possuí-la.

2. Se Reis e Duques retornassem 
(fu) à simplicidade da madeira bruta (p’u)
as dez mil coisas sob o Céu se submeteriam naturalmente (tzu-jan).

3. “Céu e Terra” produzem o doce orvalho que sem interferência
dos homens permeia a todos por igual.

4. Quando a madeira é talhada aparecem os nomes (ming).
Quando aparecem os nomes (ming) é hora de parar.
E é sabendo quando parar que não se corre mais perigo.

5. O Tao é como o mar para o qual todos os rios e riachos fluem.

XXXIII
1. Aquele que conhece os outros é inteligente;
aquele que conhece a si mesmo é esclarecido.
Aquele que vence o outro é forte;
aquele que vence a si mesmo é poderoso.
Aquele que se satisfaz com o suficiente é rico;
aquele que mantém seu propósito é constante;
aquele que não perde seu lugar é estável;
aquele que morre mas não perece, tem uma vida longa.

XXXIV
1. O Ta Tao (Grande Caminho) flui por toda parte, 
tanto à esquerda quanto à direita.
As dez mil coisas dependem dele para a vida e ele as aceita como são.
Realiza a obra sem reclamar os créditos.
Veste e alimenta as dez mil coisas sem se apropriar delas. Sempre sem desejos (wu-yu) pode ser chamado de “pequeno” (hsiao).
As infinitas coisas retornam a ele, pode ser chamado de “grande” (ta).

2. Assim, porque o Mestre não procura a grandeza, alcança a grandeza.

XXXV
1. Aquele que alcançou a Grande (Ta) Visão (Hsiang), os homens vêm a ele.
Eles vêm e não encontram desgraça, senão quietude, harmonia e paz.

2. Música e iguarias fazem o caminhante se deter;
mas as palavras proferidas pelo Tao, quanto insípidas são!

3. O olhamos e é invisível;
o escutamos e é inaudível;
o usamos e é inesgotável.

XXXVI
1. Para contraí-lo, é necessário primeiro expandi-lo;
para enfraquecê-lo, é necessário primeiro fortalecê-lo;
para destituí-lo é necessário primeiro promovê-lo;
para tirar-lhe é necessário primeiro dar-lhe.
Isso chama-se: “obscurecer a luminosidade”.

2. O brando vence o duro e o flexível o rígido.
Não se deve tirar o peixe do fundo do mar,
nem se deve mostrar ao povo as afiadas armas do império.

XXXVII
1. O Tao Imutável (Ch’ang) não age (wu-wei), mas nada fica sem ser feito.

2. Se Reis e Duques o praticassem, as dez mil coisas
sob o Céu se transformariam naturalmente (tzu-jan).
Se após a transformação elas desejassem agir (wei), eu as deteria
com a simplicidade da madeira bruta (p’u) do sem nome (wu-ming).
A simplicidade da madeira bruta (p’u) do sem nome (wu-ming) 
significa sem desejos (wu-yu).
Sem desejos (wu-yu) significa quietude (hsu).

3. Assim, o império recupera a ordem naturalmente (tzu-jan).


TE

XXXVIII
1. Aquele que possui o Te (Poder Superior) não sabe que tem
poder, mas tem Te.
Aquele que possui o  te (poder inferior) acredita ter poder, mas
não tem Te.

2. Aquele que possui o Te (Poder Superior) não tem vontade de
agir e não age (wu-wei).
Aquele que possui o poder te (poderinferior) tem vontade de agir e age (wei).
Aquele que possui o humanitarismo (jen) superior tem vontade de agir (wei),
mas não age (wu-wei).
Aquele que possui a moralidade (i) superior tem vontade de agir e age (wei).
Aquele que possui o ritual (li) superior não somente tem vontade
de agir e age como que usa a violência para impor a sua vontade.

3. Assim, quando os homens perdem o Tao aparece o Te;
quando os homens perdem o Te aparece o humanitarismo (jen);
quando os homens perdem o humanitarismo aparece a moralidade (i);
e quando os homens perdem a moralidade (i) aparece o ritual (li).
O ritual (li) é apenas a aparência da lealdade e da confiança e
o início da desordem.

4. Eis porque o Mestre se ocupa com a essência (miao)e não com a aparência (hsiao);
ele escolhe o fruto e deixa a flor; ele aceita isto e rejeita aquilo.

XXXIX
1. Nos tempos antigos, as coisas que alcançaram o Uno:
o Céu alcançou o Uno e se tornou luminoso;
a Terra o alcançou Uno e se tornou sólida;
o Espírito alcançou o Uno e se tornou numinoso:
o Vale alcançou o Uno e se tornou pleno;
Reis e Duques alcançaram o Uno e governaram;
as dez mil coisas alcançaram o Uno e se reproduziram.
Eis o resultado de alcançar o Uno.

2. Se o Céu não fosse luminoso, obscureceria;
se a Terra não fosse sólida, se racharia;
se o Espírito não fosse numinoso, se dissiparia;
se o Vale não se tornasse pleno se exauriria; se Reis e Duques não governassem, seriam depostos;
e se as dez mil coisas não se reproduzissem, cessariam.

3. Assim, o nobre toma o humilde como sua base
e o alto toma o baixo como seu fundamento.
Reis e Duques se autodenominam “órfãos, solitários e indignos”.
Não se chama a isso tomar o humilde como sua base?
Diz o ditado: “consegue as partes de uma carruagem e ainda
não terás a carruagem” e “eles não queriam tinir como uma
pedra de jade, mas soar como um canto rolando”.

XL
1. O retorno (fu) é o movimento do Tao.
A fraqueza é a ação do Tao.

2. As dez mil coisas surgem da existência (yu);
a existência surge da não- existência (wu).

XLI
1. Quando um Mestre superior ouve falar do Tao, o pratica sem hesitar.
Quando um Mestre medíocre ouve falar do Tao, ora acredita ora duvida.
Quando um Mestre inferior ouve falar do Tao, ri às gargalhadas;
e se não ri alto é porque não se tratava do verdadeiro Tao.

2. Diz o ditado:
Tao esclarecido parece obscuro;
Tao que avança parece retroceder;
o  Tao reto parece torto;
Te elevado parece com o vale;
o Te branco imaculado parece manchado;
o  Te abundante parece insuficiente;
o Te forte parece fraco;
o natural e puro parece murcho.

3. O grande quadrado não tem ângulos;
o grande vaso demora a ficar pronto;
a grande música custa a ser ouvida;
a grande visão não tem forma.

4. Assim, o Tao está oculto e não tem nome (wu-ming), 
mas só ele sustenta as dez mil coisas e as leva à realização.

XLII
1. Do Tao surgiu o Uno;
do Uno surgiu a dualidade;
da dualidade surgiu a trindade;
da trindade surgiram as dez mil coisas.

2. As dez mil coisas carregam a obscuridade 
(yin) e abraçam a luminosidade (yang) 
e é pela fusão de seus sopros de vida (ch’i) que alcançam a harmonia.

3. O que os homens mais detestam é serem chamados de “órfãos,
solitários e indignos”, embora reis e duques assim se denominam.
Assim, freqüentemente, as coisas quando perdem, ganham e quando ganham, perdem.

4. O que os outros ensinam eu também ensino: “os violentos não
morrem de morte natural”.
Farei deste ditado a base do meu ensinamento.

XLIII
1. O mais brando vence o mais duro;
a não-existência (wu) penetra onde não há espaço.
Através disso vejo o valor do não-agir (wu-wei).

2. Falar (ming) sem palavras (wu-ming) e agir (wei) sem ações (wu-wei),
são poucos os que conseguem.

XLIV
1. O que é mais importante, a fama ou o próprio corpo?
O que tem mais valor, o próprio corpo ou as riquezas?
O que é pior, o lucro ou o prejuízo?

2. Aquele que se apega à fama, paga um alto preço;
aquele que mais acumula, sofre a maior perda;
aquele que se satisfaz com o suficiente, não sofre perda alguma;
aquele que sabe quando parar, se livra do perigo e tem vida longa.

XLV
1. A grande perfeição parece imperfeita, mas sua utilidade
permanece intacta.
A grande plenitude parece vazia, mas seu uso é inesgotável.
A grande reta parece torta.
A grande habilidade parece desajeitada.
A grande eloquência parece gaga.

2. O movimento vence o frio, mas a quietude vence o calor.
Assim, através da quietude (hsu) pode se ordenar o Império.

XLVI
1. Quando no Império prevalece o Tao,
cavalos de passeio fertilizam os campos.
Quando o império se afasta do Tao,
cavalos de guerra são criados nas fronteiras.

2. Não há calamidade maior do que ter muitos desejos (yu-yu).
Não há desgraça maior do que nunca estar satisfeito.
Não há desastre maior do que querer sempre mais.
Assim, aquele que se satisfaz com o suficiente está sempre satisfeito.

XLVII
1. Sem atravessar a porta, ele conhece o Império.
Sem olhar pela janela, ele vê o Tao do Céu.
Quanto mais longe se vai, menos se conhece.

2. Assim, o Mestre:
pressente tudo sem sair do lugar;
vê tudo sem olhar;
faz tudo (wei) sem ação (wu-wei).

XLVIII
1. Aquele que persevera no conhecimento aumenta mais a cada dia.
Aquele que pratica o Tao diminui mais a cada dia.
Vai diminuindo e diminuindo até alcançar a não- ação (wu-wei).
Sem ações (wu-wei) nada fica sem ser feito.

2. Sem ações (wu-wei) os antigos colocavam ordem no Império.
Se tivessem agido (wei) eles nunca teriam colocado o Império em ordem.

XLVIX
1. O Mestre não tem idéias próprias,
mas usa as idéias dos outros homens como se fossem suas.

2. Com os tolerantes ele é tolerante e com os intolerantes
também é tolerante;
e assim obtém tolerância.
Nos sinceros ele acredita e nos insinceros também acredita;
e assim obtém sinceridade.

3. O Mestre tem uma aparência discreta e sua mente forma um todo harmonioso com a mente do seu povo.
Os homens emprestam seus olhos e ouvidos e o mestre os trata como se fossem crianças.

L
1. Aquele que alimenta a vida em excesso encontra a morte.
Três entre dez são companheiros da vida;
três entre dez são companheiros da morte;
e três entre dez são companheiros da vida, mas morrem cedo.
E por que isso? Porque se excedem na vida.

2. Ouvi dizer que aquele que preserva verdadeiramente sua vida
não é atacado por tigres nem rinocerontes, 
e no campo de batalha não é ferido pelas armas.
Os tigres não encontram onde cravar suas garras 
nem os rinocerontes onde enfiar seus cornos, 
nem as armas onde afundar suas lâminas.
E por que isso? Porque nele não há lugar para a morte.

LI
1. O Tao as gera e a o Te as nutre.

2. A matéria lhes dá a forma física
e são completadas de acordo com as tendências e as circunstâncias.
Assim, as dez mil coisas, sem exceção, valorizam o Tao e apreciam  o Te.

3. O Tao é valorizado e o Te apreciado, não por um decreto,
mas espontaneamente (tzu-jan).

4. Assim, o Tao as gera e o Te as nutre, as desenvolve, as completa, as amadurece, as mantêm, as abriga e as protege.

5. Produz sem se apropriar delas;
dá sem exigir retribuição;
guia sem comandar;
Esse é o seu 
Poder Misterioso (HsüanTe) .

LII
1. À origem das dez mil coisas sob o Céu,
pode-se chamar de Mãe (Tao).
Aquele que encontrou a Mãe conhece os filhos;
e é porque conhece os filhos e encontrou a Mãe
se livra do perigo pelo resto de sua vida.

2. Fecha a boca, tranca as portas e viverás sem decair até o final dos teus dias.
Abre a boca, aumenta tuas tarefas e não haverá salvação até o final dos teus dias.

3. Perceber o imperceptível, é esclarecimento.
Aderir à fraqueza, é fortaleza.
Aquele que conhece o brilho exterior, mas retorna (fu) ao
esclarecimento interior, se livra do perigo pelo resto de sua vida.
Isso chama-se“praticar o Imutável" (Ch’ang).

LIII
1. Se eu tivesse um mínimo de conhecimento andaria pelo 
Ta Tao
 (Grande  Caminho) com o único temor de me perder dele.
Embora o Ta Tao seja reto e seguro, os homens preferem os atalhos.

2. A corte está extremamente bem cuidada, os campos cheios de
mato e os celeiros vazios.
Usam-se elegantes vestidos; carregam-se afiadas espadas;
excedem-se na comida e na bebida;
e acumulam mais objetos de valor do que podem usar.
Isso é banditismo e extravagância, não o 
Ta Tao .

LIV
1. Aquele que está perfeitamente plantado não pode ser arrancado.
Aquele que está perfeitamente enraizado não pode ser solto.
Graças ao Te, geração após geração o sacrifício aos ancestrais nunca será suspenso.

2. Quando alguém cultiva o  Te, na própria pessoa, torna-se o Te verdadeiro;
quando alguém cultiva o Te na família, torna-se o Te transbordante;
quando alguém cultiva s o Te na aldeia, torna-se o Te duradouro;
quando alguém cultiva o Te no Reino, torna-se o Te abundante;
e quando alguém cultiva o Te no Império, torna-se o Te universal.

3. Assim, graças ao Te a pessoa deveria ser vista como uma pessoa;
graças ao Te a família deveria ser vista como uma família;
graças ao Te aldeia deveria ser vista como uma aldeia;
graças ao Te ,o Reino deveria ser visto como um Reino;
e, graças ao Te ,o Império deveria ser visto como um Império.
4. Como posso pressentir o Império? Justamente através disto.

LV
1. Aquele que alcançou o Te é como um bebê.
Os insetos venenosos não o picam; as feras não o ferem;
e as aves de rapina não o atacam.
Seus ossos são brandos; seus tendões flexíveis;
mas seu aperto de mão é firme.
Nada sabe sobre a união do homem e da mulher,
mas seu membro fica teso; significa que a sua vitalidade está no auge.
Chora o dia inteiro sem ficar rouco; significa que a harmonia é perfeita.

2. Alcançar a harmonia significa estar de acordo com o Imutável (Ch’ang)

3. Estar de acordo com o Imutável (Ch’ang) é esclarecimento.

4. Encher a vida até a borda é de mau agouro;
agitar o coração (hsin) leva-o à rigidez;
quando as coisas alcançam o apogeu começam a declinar.
Tais ações são contrárias ao Tao e tudo que é contrário ao Tao morre cedo.

LVI
1. Aquele que sabe não fala;
aquele que fala não sabe.
Fecha a boca;
tranca as portas;
apara as arestas;
desata os nós;
obscurece a luminosidade;
assenta a poeira;
isso chama-se “Acordo Misterioso”.

2. Aquele que o alcançou,
não pode ser aceito nem rejeitado;
não pode ser favorecido nem prejudicado;
não pode ser elogiado nem humilhado.
Eis porque ele é o mais valioso dos homens sob o Céu.

LVII
1. Para governar o Reino, usa-se a retificação dos nomes (cheng-ming).
Para ganhar as batalhas, usa-se a tática da surpresa.
Mas, para ordenar o Império, usa-se o não-agir (wu-wei). Como sei disso?
Justamente através disto.

2. Quanto mais proibições e restrições, maior a opressão dos homens;
quanto mais armas, maior a revolta;
quanto mais artesões espertos, mais invenções inúteis;
quanto mais leis e regulamentos, mais bandidos e ladrões.

3. Assim,o Mestre disse:
sem ações (wu-wei) os homens transformam-se naturalmente (tzu-jan);
na quietude (hsu) os homens endireitam-se naturalmente (tzu-jan);
sem ações (wu-wei) os homens prosperam naturalmente (tzu-jan);
sem desejos (wu-yu) os homens retornam à simplicidade da madeira bruta (p’u) naturalmente (tzu-jan).

LVIII
1. Quando o soberano não oprime e passa desapercebido, os homens permanecem
contentes e satisfeitos;
quando o soberano oprime e aparece, os homens ficam descontentes e insatisfeitos.

2. A desgraça esta latente na felicidade;
e na felicidade está latente a desgraça
e ninguém sabe quando isso vai parar.

3. Quando o correto vira incorreto e o perfeito se torna imperfeito,
é porque os homens se perderam há muito tempo.

4. Assim, o Mestre:
tem ponta, mas não fura;
tem gume, mas não corta;
é correto, mas não faz concessões;
tem brilho, mas não ofusca.

LIX
1. Para governar o Império e servir ao Céu, nada como a frugalidade. 
Frugalidade significa “adquirir o hábito cedo”.
“Adquirir o hábito cedo” significa acumular o Te.

2. Aquele que acumulou o Te pode vencer qualquer obstáculo.
Aquele que vence qualquer obstáculo não conhece limites.
Aquele que não conhece limites está apto para governar o Império.

3. Somente aquele que encontrou a Mãe (Tao) pode governar o Império por muito tempo.
Isso chama-se “perfeitamente plantado” e “profundamente enraizado”.
Esse é o Tao da vida longa através do olhar fixo.

LX
1. Governar o grande Império é como fritar um peixinho.
Os que praticavam o Tao para governar tudo o que existe sob o Céu, 
não permitiam que os maus espíritos (kuei) desenvolvessem seus poderes dentro deles.
Não permitiam que os maus espíritos desenvolvessem seus
poderes dentro deles, nem que o bom espírito (shen) do Mestre fosse
usado para ferir outros homens.
Como o bom espírito do Mestre não era usado para ferir
outros homens, ele se livrava do perigo.

2. Assim, cada qual estando a salvo do perigo, 
ambos acumulavam o Te para benefício de todos sob o Céu.

LXI
1. O grande Império é como o leito de um rio, para o qual todas as correntes fluem.
É o ponto de convergência das dez mil coisas sob o Céu.
É a fêmea do mundo. A fêmea do mundo pela quietude (hsu) domina o macho
e pela quietude (hsu) permanece embaixo.

2. Um grande reino pode conquistar um pequeno reino
colocando-se embaixo;
e um pequeno reino também pode conquistar um grande reino
permanecendo embaixo.
Assim, uns conquistam pequenos Reinos colocando-se embaixo e outros
conquistam grandes Reinos permanecendo embaixo.

3. Na verdade, o que um grande reino quer é anexar outros reinos;
e o que um pequeno reino quer é ser anexado por um grande reino.
Assim, ambos cumprem a missão, mas é o grande reino que
deve se colocar embaixo.

LXII
1. O Tao é como o canto sudeste da casa.
É o tesouro do homem perfeito e o refúgio do homem imperfeito.
Boas palavras podem ganhar o respeito dos outros e
boas ações podem comprar honras.
Mesmo o homem sendo imperfeito, o Tao não o abandona.

2. Assim quando o soberano ocupa seu lugar como filho do Céu
e escolhe seus três ministros, no lugar de presenteá-lo com
grandes pedras de jade, precedidas de quatro cavalos, melhor
seria oferecer-lhe o Tao permanecendo sentado (tzo).

3. Por que os antigos valorizavam tanto o Tao?
Não eram eles que diziam daqueles que se tornavam parte dele:
“os que o procuram o acharão” e “os culpados serão libertados”.
Por isso, era considerada a mais valiosa das coisas sob o Céu.

LXIII
1. Agir(wei) sem ações (wu-wei);
fazer sem feitos
saborear sem sabores;
grandes ou pequenos, muitos ou poucos, retribui os insultos com o Te

2. Trata do difícil enquanto ainda é fácil.
Lida com o grande enquanto ainda é pequeno.
Grandes dificuldades começaram com grandes facilidades
e grandes obstáculos começaram como pequenos obstáculos.
Assim, porque o Mestre não procura a grandeza, alcança a grandeza.

3. Diz o ditado: “aquele que faz promessas levianas não inspira confiança” e
“aquele que acha as coisas muito fáceis certamente encontrará grandes dificuldades”.
Por isso, o Mestre, considerando as coisas fáceis como se fossem difíceis,
não encontrará nenhuma dificuldade.

LXIV
1. O que permanece quieto (hsu) é fácil de se segurar;
antes de receber um agouro é fácil fazer planos.
o que é frágil é fácil de se quebrar;
e o que é diminuto é fácil de se espalhar.
Trata das coisas antes de se manifestar;
coloca-as em ordem antes que entrem em desordem.

2. Assim, a árvore larga como o abraço de um homem começou com uma semente;
a torre de nove andares começou com um montículo de terra;
a viagem das mil léguas começou com um primeiro passo.

3. Aquele que age (wei), falha;
aquele que tenta segurá-lo, perde-o.
Assim, o mestre não age (wu-wei) e não falha;
não tenta segurá-lo e assim não o perde.
Mas os homens, quando estão prestes a realizar a obra,
freqüentemente falham.
Cuida do fim tanto quanto do princípio e realizarás a obra.

4. Assim, o Mestre deseja (yu) sem desejos (wu-yu);
não aprecia objetos de valor;
aprende sem aprender;
retorna (fu) às coisas que os homens ignoraram;
sustenta as dez mil coisas naturalmente (tzu-jan) e nunca ousa agir (wu-wei).

LXV
1. Nos tempos antigos, aqueles que praticavam o Tao não procuravam esclarecer os homens,
mas mantê-los ignorantes.
Quanto mais conhecimentos os homens têm, mais difícil é de governá-los.
Assim, aqueles que governam através dos conhecimentos
são como bandidos que rapinam a terra;
e aqueles que governam sem os conhecimentos
aportam uma dose de boa fortuna à terra.

2. Perceber a diferença entre essas duas coisas
significa “pressentir a norma”.
“Pressentir a norma” significa alcançar o Hsuan Te (
Poder Misterioso).
O Hsuan Te profundamente penetrante, vai até
tão longe e com ele as coisas retornam (fu) ao lugar de origem.
É assim que se alcança o “Grande Acordo Harmonioso”.

LXVI
1. Por que os grandes rios reinam sobre as cem correntes menores?
Justamente porque têm a virtude de permanecer abaixo delas.
Por isso reinam sobre todas elas.

2. Assim, o Mestre, para permanecer acima dos homens, deve
usar palavras que o coloquem abaixo deles;
para guiá-los, deve segui-los.
Somente assim ele pode permanecer no alto sem que os homens sintam seu peso;
somente assim ele pode guiá-los sem que os homens se sintam comandados;
somente assim os homens permanecem satisfeitos de serem
empurrados e nunca se cansam dele.

3. E porque não compete, ninguém pode competir com ele.

LXVII
1. Todos sob o Céu sabem que, embora meu Tao seja grande,
ele parece sem valor.
E é justamente por ser grande que ele parece sem valor.
Se ele fosse como qualquer outro, há muito tempo teria se
percebido a sua insignificância.

2. Eu tenho três tesouros;
guarda-os e conserva-os!
O primeiro é a tolerância (tz’u);
o segundo é a frugalidade;
e o terceiro é não querer ser "o primeiro de todos sob o Céu”.
Pois somente aquele que é tolerante, pode ser corajoso;
somente aquele que é frugal, pode ser generoso;
somente aquele que não ousa ser “o primeiro de todos sob o Céu” pode ser o chefe dos Ministros.

3. Nos tempos atuais, a coragem sem tolerância;
a generosidade sem frugalidade;
e a liderança sem obediência, significa a morte.
4. A tolerância é vitoriosa quando ataca, e firme quando se defende.
Assim, o Céu arma com tolerância àqueles que quer proteger.

LXVIII
1. O soldado experiente não é opressivo. O lutador experiente não fica com raiva. O conquistador experiente não compete com os outros.
O líder experiente permanece atrás dos outros.

2. Isso chama-se “a capacidade de guiar os homens” e o “poder de não competir”

3. Esse é o segredo de se abraçar ao Céu, o maior princípio dos tempos antigos.

LXIX
1. Os estrategistas dizem:
“não ouso tomar uma ação ofensiva, prefiro tomar uma ação defensiva;
“não ouso avançar um passo, prefiro recuar uma légua”.
Isso chama-se marchar sem formação;
arregaçar a manga sem mostrar o braço;
segurar a empunhadura sem parecer ter uma arma; 
enfrentar o inimigo sem apresentar frente de batalha”.

2. Não há desgraça maior do que subestimar o inimigo.
Subestimar o inimigo resultará na destruição dos meus tesouros.
Assim, quando dois exércitos se enfrentam, vence o que luta com tolerância.

LXX
1. Minhas palavras são muito fáceis de se entender
e muito fáceis de se colocar em prática;
mas ninguém as entende e ninguém as coloca em prática.

2. Minhas palavras têm um princípio e minhas ações uma lei,
e porque os homens não entendem isso eles não me entendem.

3. Quanto menos me entendem, maior o meu valor.
Assim, o Mestre usa roupas ordinárias por fora, mas carrega jade no peito.

LXXI
1. Saber que não se sabe é o melhor.
Não saber que não se sabe é uma doença.
Somente aquele que aceita essa doença como doença, pode se livrar dela.

2. Assim, porque aceita essa doença como doença, o Mestre esta livre dela.

LXXII
1. Quando os homens não temem a lei,
uma lei muito mais poderosa recai sobre eles.
Não reduzas suas moradas nem oprimas suas vidas.
E é justamente porque não oprimes suas vidas que eles não se afastam de ti.

2. Assim, o Mestre conhece a si mesmo, 
mas não aparece; conhece seu valor, mas não se exalta a si mesmo. 
Ele aceita isto e rejeita aquilo.

LXXIII
1. Aquele que ouça ter coragem morrerá.
Aquele que ouça não ter coragem viverá.
Destes dois, um se beneficia e outro se prejudica
e quem sabe por que o Céu desgosta do que desgosta? 
Nem o Mestre sabe a razão do porquê.

2. O Tao do Céu não compete, mas conquista;
não fala, mas dá respostas;
não chama, mas as coisas vêm a ele naturalmente (tzu-jan);
não tem pressa, mas têm planos.

3. Embora a teia do Céu seja vasta e sua malha grossa, nada escapa dela.

LXXIV
1. Os homens não temem a morte.
Por que então ameaçá-los com a pena de morte?
E mesmo que os homens temessem a morte, quem de nós ousaria castigar os faltosos?
Para isso existe o Supremo Verdugo e tomar o seu lugar
seria como serrar madeira no lugar do Mestre Carpinteiro.

2. Diz o ditado: “aquele que tenta serrar madeira no lugar do
Mestre Carpinteiro, dificilmente escapará de ferir sua mão”.

LXXV
1. Os homens morrem de fome porque os que estão acima deles 
recebem uma cota excessiva de grãos; por isso os homens morrem de fome.

2. Os homens são difíceis de governar porque os que estão acima deles, agem;
por isso os homens são difíceis de governar.

3. Os homens não temem a morte porque os que estão acima deles lutam pela
vida muito intensamente; por isso os homens não temem a morte.

4. Eis porque, somente aqueles que no correm atrás da vida, preservam a vida.

LXXVI
1. Quando os homens nascem, são brandos e flexíveis;
quando morrem, tornam-se duros e rígidos.
Quando as plantas têm vida, são tenras e frágeis;
quando morrem, tornam-se quebradiças e secas.
Assim, os duros e rígidos são “companheiros da morte”;
e os brandos e flexíveis são “companheiros da vida”.

2. Diz o ditado: “a lâmina demasiado rígida se partirá”;
e “a árvore mais dura será cortada”.
Eis porque os duros e rígidos são derrubados;
e os brandos e flexíveis permanecem no alto.

LXXVII
1. O Tao do Céu é como esticar um arco:
o extremo de cima desce e o extremo de baixo sobe.
Assim, o Tao do Céu reduz o excesso e completa o insuficiente.

2. O Caminho do homem não é assim:
reduz o insuficiente e completa o excesso.

3. Somente o Mestre tem o excesso suficiente para
alcançar a todos sob o Céu.
Assim, o Mestre dá sem esperar retribuição;
realiza a obra sem reclamar os créditos;
não revela seu valor.

LXXVIII
1. Não há nada mais brando e flexível que a água;
mas nada há de melhor para vencer as coisas duras e rígidas.
Por isso, é insubstituível.
Todos sabem que o brando vence o duro e que o flexível
vence o rígido, mas ninguém o pratica.

2. Assim, o Mestre disse: “somente aquele que sofre as desgraças do Império 
pode tornar-se o senhor de sua terra;
somente aquele que toma para si os infortúnios do Império
pode tornar-se o rei de todos os que habitam sob o Céu”.
3. As palavras certas parecem erradas.

LXXIX
1. Acabar com um grande ressentimento certamente deixará
algum ressentimento.
Como poderia ser isso considerado bom?
Assim, o Mestre cumpre a metade esquerda do contrato
e não culpa a outra parte.
Aquele que alcançou o Te.
presta atenção à metade esquerda do contrato;
aquele que não alcançou o Te presta atenção aos erros dos outros.

2. O Tao do Céu não faz distinções:
está sempre do lado do homem tolerante.

LXXX
1. Num país pequeno e de poucos habitantes, mesmo existindo
invenções que reduziam em dez e em até cem vezes a mão-de-obra,
nunca seriam utilizadas.
Os homens dariam valor a suas vidas e não migrariam para longe.
Haveria, inclusive, barcos e carruagens, mas ninguém os usaria.
Haveria flechas e armas, mas ninguém as exibiria.

2. Os homens não usariam nenhuma outra forma de escritura que não fosse os nós de cordas;
se satisfariam com seus próprios alimentos;
se contentariam com suas roupas simples;
se conformariam com seus lares;
e gostariam de tarefas rústicas.
O lugar mais próximo estaria tão perto que se ouviria o cantar
dos galos e o latir dos cachorros, mas os homens
envelheceriam e morreriam sem nunca terem estado lá.

LXXXI
1. As palavras verdadeiras não são bonitas;
as palavras bonitas não são verdadeiras.

2. Aquele que é tolerante não argumenta;
e aquele que argumenta não é tolerante.

3. Aquele que sabe não tem grandes conhecimentos;
aquele que tem grandes conhecimentos não sabe.

4. O Mestre não acumula para si.
Quanto mais ele usa para os outros, mas ele tem.
Quanto mais ele dá para os outros, mais ele recebe.
5. O Tao do Céu beneficia os outros sem ferir;
Tao do Mestre age sem competir.

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